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O conto de hoje foi enviado por uma assinante do Grão Gourmet, que, além de professora, é poeta
Café gourmet
– Rúbia está demorando… O que será que houve?
Pensava Oliver, preocupado com a demora de sua esposa. O céu iniciava sua metamorfose, nos ventos fortes que traziam as nuvens carregadas. A possível chuva que era tão bem-vinda, de repente tomou a forma de um obstáculo frente a ausência da mulher daquela pequena casa.
Eles moravam longe dos aglomerados urbanos, por escolha própria de quem queria mais bem-viver. Uma casa modesta, com suficientes coisas, objetos ou utilidades que os faziam felizes, sem necessidade das compras compulsivas, possivelmente responsáveis pelas grandes mudanças civilizatórias. As nuvens que lá surgiam eram como a tela do René Magritte, inspiravam a vida com toque de arte e poesia.
Mas Rúbia demorava. O celular não chamava, embora ele tivesse feito a tentativa de ligar, de enviar mensagens, e de entrar em contato. Mas era um lugar sem muito acesso à internet, especialmente quando havia ameaças de chuvas. Sem muito o que fazer, ligou o fogão e aqueceu a água. No ritual cotidiano, pegou o café e só então a memória veio povoar o momento.
O aroma aveludado entrava nas narinas como labirintos pretéritos, recheados de ações que tinham ocorrido, contudo havia uma projeção do futuro. Reviver a memória, de fato era uma redescoberta, um novo momento de olhar para a frente, enfeitando o horizonte futuro. Ali brincando com a memória, descobriu que as nuvens se desmanchavam em chuvas torrenciais, obrigando-o a fechar as portas e janelas. Com a casa fechada, parecia que a fragrância do café brincava com a memória de forma mais intensiva. As pequenas fumaças de vapor dançavam no ar, ao som do barulho das chuvas. E o aveludado sabor daquele café trazia também o cheiro de vida.
Oliver estava embalado pelo perfume do café, vendo as danças das fumacinhas bailarinas, degustando um sabor que misturava lembranças passadas com planos do amanhã. A magia do café se explodia nas texturas da vida e ele não sabe quanto tempo ficou assim meio embriagado, entre as saudades pretéritas e as esperanças do amanhã.
Michèle Sato – Professora da UFMT e poeta
PS: o desfecho do conto é por conta (e risco) de cada leitor.
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